Sexo e Morte. Juntos, por que?

A cultura atual achará, provavelmente (e, no mínimo), estranho “combinar” sexo e morte. Mas, se se dedicar uns momentos para reflexão (nunca temos tempo, hoje, ainda mais para o que nos afeta o mais profundo), certamente entenderá. São duas “energias” avassaladoras que movem e mantêm o mundo, embora sejam, ambas, motivo de medo e/ou felicidade (esta também nos assusta, embora neguemos). Parecem contrários. Não são. MORTE e SEXO. NINGUÉM passa pela vida, ou a vive plena sem uma ou outro. Não temoos sido, porém, capazes de os aprender ou ensinar. Fugimos de ambos os temas. Permeiam o dia a dia e fingimos não existirem. A sexualidade (que TODOS, do recém nascido ao moribundo, até os que “optam por não a viver” - se isto fosse possível -), todos a vivem. Mas, se não se foge do "olho no olho", esconde-se. Metem medo, e muito. Já a morte, retratada terror, que “vem” para nós (na verdade, “está” em nós) a temos como medo maior, sem disfarce. Porém, estranhamente complementares, “controlam” o mundo e fazem o humano trilhar menos perto dos extremos. E, paradoxalmente, nos extremos... Sexo e Morte. O mundo não existiria, tal como é, sem a morte, sem o sexo e seus exercícios, suas presenças.

Ora, entendamos. Nenhuma mente, por mais crédula que seja, por mais inocente que se possa imaginar, ainda acredita em fantasias (até úteis no despertar da humanidade, ainda selvagem, com pouco ou nenhum conhecimento, onde tudo era ensinado ou contado de maneira figurada, alegórica, para dar uma mensagem, em geral forte, que tenta cooptar para a causa defendida, seja por vislumbres de alegria e paz, como a promessa do paraíso, seja pela ameaça de dor, como a figura do inferno). Embora nos nutramos delas e nelas.

Nascer pela cegonha. Ou acreditar que a gente tem o poder de “fazer um filho”. Fazemos, sim, pelo SEXO, um corpo. A matéria. E, assim, nos satisfazemos em relação ao poder de criar, e nos sentimos bem, imaginando que o filho é fruto nosso, “fabricação” nossa. Se ele, o corpo, não for habitado, será um "monte de matéria", um belíssimo bólido, sem motorista. Perguntamos se o clone (que não tardará assim tanto, provavelmente) seria nossa repetição. Muita inocência imaginar que sim. Provavelmente, ao “nascer”, seria nossa figura de quando nascemos, mas até aí já começa a diferença, pelo tipo de parto, por exemplo. Ou seja, o meio externo entrará com altíssima contribuição na formação do ser humano. É preciso, então, que ALGO ainda "mais acima", que não pode ser definido pela nossa ciência, venha habitar o corpo. SOPRO, ESPÍRITO, ALMA, NOUS, PNEUMA, não importa que nome venhamos a dar. Sem esta essência, a eterna, definitiva, imortal, nada de vida no corpo. E, claro ainda, Deus não fica de plantão esperando a gente “proporcionar condições” para Ele nos “dar um filho”. O que entendemos nosso, filho, é muito mais. Já existe desde a criação e vem habitar o corpo, na esperança de nos trazer felicidade e ser, ele próprio, feliz. E o faz por livre e espontânea vontade (isto de dizermos que “filho não pediu para vir ao mundo” é, ainda, uma escapadela que encontramos para justificar-nos diante de algo que julgamos não correto na relação com o mesmo. Não é verdade. Pediu para o abrigarmos na matéria, e foi aceito.).

Mas, para nascer, é preciso que haja a primeira morte significativa (mortes acontecem dentro do útero, quando nos formamos e crescemos e, na verdade, ocorrem ainda antes de sermos concebidos, pois nossos “quase corpos”, os espermatozóides, se perdem aos milhões, para que tenhamos sido o vencedor). O problema é que não nos “ligamos” nisto (o que é bom, na medida em que ainda não estamos prontos para entender pois, imaturos, “temos os filhos” como propriedade, como nossa continuação...). E, durante a vida, inúmeras outras mortes acontecerão, todo dia, a toda hora, e não percebemos ou não queremos perceber. As mortes vão se somando. A elas se sucede, sempre, um nascimento, ou um renascimento. Somos outros depois de cada morte, mesmo que não a percebamos ou não percebamos nossa mudança. Morremos, pois, todos os dias, e renascemos. Morrer e renascer. Aquela criancinha indefesa vai se transformando até se tornar adulta. Transformações, PASSAGENS. Isto, sem relacionar as mortes do dia a dia que não estão no nosso corpo, mas nos atingem, nos modificam, nos “matam” lentamente, e nos permitem renascer novamente, mais fortes, mais experientes. Até que chega a GRANDE MORTE, a que aprendemos a ver como o final e tal nos embota a percepção pois é muito mais que isto, é o RENASCER, LIBERTAR. Mas, se TODAS as mortes que nos permeiam são cercadas de renascer, porque a “última” não seria, também, um renascer?

TODOS queremos amar. Viver nossa sexualidade. Temos os orgasmos da vida como mostra do êxtase que é o viver no Paraíso, livre enfim. Mas, também, TODOS queremos morrer. SIM, TODOS QUEREMOS MORRER. Um exercício a que nos furtamos, negamos, nos revoltamos, até. Mas é a pura verdade. Faça uma pequena reflexão e se imagine imortal, preso no corpo material, corruptível, que vai envelhecer, envelhecer, até não se prestar a mais nenhuma qualidade de vida. Ali, velho e alquebrado, dependendo em tudo de todos, com seus entes queridos já partindo ou em processo de também partir, você sozinho... Aí implorará pela MORTE. Não há como fugir disto. É nossa chave de libertação. Não a tornemos dolorosa, quando ela é nossa grande amiga. Não precisamos chamá-la, ou esconjurá-la. Esta está em nós, é nossa grande e amada amiga, a libertadora.

Então, o entrelaçamento proposto é absolutamente pertinente. NINGUÉM, absolutamente ninguém, vive à margem do SEXO (que o fez existir como corpo) ou sem a MORTE (que lhe permite voltar, inteiro).

Obs: As colocações são estruturadas na percepção cristã, mas se pode inferir o mesmo raciocínio em relação a TODAS religiões. Bem vindo à Vida

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sábado, 22 de maio de 2010


MEDO DA MORTE, MEDO DA VIDA?

Sebastião Galeno da Silva
 I Congresso Brasileiro de Tanatologia, Belo Horizonte, MG.

O enigma da morte (ou da vida?) indubitavelmente, excita a mente e o coração, induzindo sentimentos vividos sempre intensamente, muitas vezes contraditórios, geralmente tendentes ao sofrimento dos que a “enfrentam” sem preparo e mais ainda dos circundantes ativos ou não. Na verdade não nascemos com tais suscetibilidades, eis que ainda não manipulados pela anti cultura da morte que induz ao medo mas este nos soa tão grande que preferimos negá-la “até a morte”. Invariavelmente, quando instados a responder sobre nossa relação com a morte, a resposta, quando dela não fugimos, é “não tenho medo, apenas não quero sofrer ou fazer sofrer aos que me amam, além de não querer dar trabalho a ninguém, preferindo uma morte rápida (sem sofrimento)”. Nesta resposta padrão há a expressão do medo não assumido, disfarçado, em que se transfere ao outro a negação, conquanto se admita a mesma, “apenas” querendo determinar como gostaria de morrer, já que não há mesmo como fugir, além de mostrar insegurança sobre se teria mesmo alguém a amá-lo de verdade (esta outra enorme fonte de sofrimento), pois não estamos seguros se haverá amor verdadeiro, de doação, partilha, cuidados, a uma pessoa terminal dependente, que ainda nos exporia abertamente as “fraquezas” humanas, como sejam as manifestações de medo, as manifestações da fisiologia do corpo material.
Mas, seria, mesmo, medo da morte, o que temos? Sem dúvida é o que tentam nos incutir durante toda nossa existência os que nos antecedem, voluntariamente ou não. (MORTE, no dicionário, é, entre outras, “do lat. Morte, ....Termo, fim. Destruição, ruína. Fig. Grande dor, pesar profundo...” Os poderosos sempre se arvoraram em donos da mesma e  incutiram o medo dela para manter o poder (não nos esqueçamos que a ignorância do dominado sempre foi o melhor meio de se manter o poder, como o fizeram e fazem os grandes ditadores), e nós transmitimos o mesmo medo aos nossos descendentes, como o recebemos de nossos pais que somente descobrem seu valor quando já “velhos” e velho não tem valor na nossa cultura de consumismo, materialismo, imediatismo.
É tão forte o materialismo na conceituação de vida, que o dicionário, ainda aí, a trata como o contrário da morte, ao listar seu significado: “do latim vita... Conjunto de propriedades e qualidades graças às quais animais e plantas, ao contrario dos organismos mortos ou da matéria bruta, se mantêm em contínua atividade... estado ou condição dos organismos que se mantêm nesta atividade desde o nascimento até a morte...” Felizmente, talvez pela energia que vida impõe de certa forma, na última linha, quase sem nenhuma pretensão, timidamente, lasca um lampejo de luz “... Estado ou condição do espírito depois da morte”....
Bem o dizia Platão: “Podemos perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia é quando os homens têm medo da luz”.
Então, o que realmente existiria por traz de tudo isto? Parece que o verdadeiro medo não vem, definitivamente, de fora. Apenas o usamos para reforçar nosso medo interior. Na verdade, embora tentemos negar, temos consciência plena do que nos ocorrerá na morte, não no processo do morrer materialmente, mas do que vem imediatamente depois, ou seja, nosso auto (e severo) julgamento. Durante a vida, no “calor” da competição que ela se deixou tomar, sempre temos como fugir de nossa consciência, acobertados pelas mais variadas desculpas, mas no momento da morte, na solidão que nos envolve, não há como perpetuar a fuga. De alguma maneira todos sabemos e aceitamos que este será um momento em que avaliaremos nossos atos e infelizmente o faremos com nossa perfeição de filhos à imagem e semelhança do Pai, que queremos a pureza e não aceitamos menos que isto, pela nossa índole, e sempre haveremos de encontrar, na vida terrena, como seres imperfeitos, alguma “culpa”. Daí nos condenaremos.  
Quanto é dura a presença da consciência no dia a dia a nos julgar! Isto é o que verdadeiramente tememos, não a morte, em si.    
Constantemente vivemos a morte na mídia e nos deslumbramos com a mesma. Quanto mais atroz mais nos chama a atenção. Parece que queremos enganar a nós mesmos, pois “aquilo” felizmente está tão longe da gente... O show que a TV nos dá, on line, por exemplo, em especial  da violência, atrai como mel à mosca. Agora então, com a guerra em plena força, não há alguém no mundo que não a viva intensamente. Alguns com revolta, outros com medo, muitos apenas inocentes curiosos, mas todos envolvidos de alguma maneira. É atávica, a atração. E os poderosos (agressores, mídia), se fartando às nossas custas, materiais e espirituais.
Mas podemos tirar, como sempre, lições. Numa entrevista com ex combatentes americanos, por exemplo, eles testemunharam a verdadeira causa do medo da morte e a presença deste, invariavelmente. Todos o admitem... mas apenas quando confrontados com a solidão física, os momentos de “descanso”, porque aí não há como fugir ao pensamento, e ao julgamento... Vem aquela sensação, disseram, de impotência, de inutilidade, de horror, tudo num misto de sentimentos que não se consegue definir. É o julgamento que fazemos de nossos atos e atitudes e o fazemos cruelmente, nos condenando quase sempre, perdendo a esperança que se esvai aos menos preparados. Nestes momentos se pensa na vida, no que se fez ou deixou de fazer, e vem um vazio enorme. Por isto fugimos, corremos, gritamos, tentamos fazer de conta que não é conosco, como se pudéssemos fugir eternamente... ou enlouquecemos... E ainda não é o final, o “juízo final”, tantas vezes usado para nos amedrontar. Quando estão no calor da luta não há como desligar as baterias do aqui e agora e não há, então, lugar para o medo. Funcionamos no automático, movidos pelo instinto de sobrevivência. Há que ir à frente. É vencer ou vencer, para não morrer.
A morte, portanto, mete medo, mas da vida, porque nos leva a pensar nesta, com nossos “olhos” de pureza que temos na origem, a qual não queremos perder. Nem os grandes Santos ou os grandes personagens de virtude da humanidade se julgaram merecedores do perdão. E mesmo eles jamais pensavam na recompensa, enquanto homens, conquanto a esperassem, como filhos de Deus, porque se prepararam, cultivaram as virtudes, especialmente as teologais. No momento da morte a esperança se torna a mãe de todas e, embora dita a ultima que morre, se faz presente, nos alenta, e não morre jamais.
Então, por que aceitamos, mantemos e ate alimentamos tais medos? Seria simplesmente o comodismo e a falta de coragem para assumir a VIDA na sua plenitude? Por que sucumbimos à pressão da cultura que nos domina, levando-nos a valorar somente o que podemos medir com nossas medidas tão primitivas, com nossos órgãos dos sentidos tão maravilhosos e ao mesmo tempo tão pequenos para medir a grandeza da VIDA?
A ciência que praticamos, desde Francis Bacon, com seu rigor de medição, repetição, comprovação, com a lógica dos números, não permite que valorizemos o valor das coisas que realmente contam, como diziam os pré socráticos, as invisíveis. Precisamos da ciência, sim, mas há que reconhecer que, no que transcende nossa capacidade, precisamos usar a visão do espírito, que conhece a igualdade nas diferenças e as diferenças nas igualdades, e que não pode ser medida por ela. E a ciência que praticamos considera a morte como fim (vide dicionários), como derrota (vide medicina, onde os profissionais são preparados para a derrotar e saem acreditando que “vencerão a morte”, sendo sempre derrotados, infelizes portanto), e se nos curvarmos a ela, aceitando o conceito de perda, de fim, de destruição, de sofrimento, seremos infelizes. Então, não é possível usar os paradigmas da morte na ciência terrena (se é que ela os tem), como formatada por Francis Bacon, considerando apenas seus aspectos biológicos, materiais, “passiveis de comprovação”, porque ela transcende tudo isto e muito mais e não a podemos viver mais vezes, como num ensaio científico.
Pelo contrario, se a buscarmos para a entender ou pelo menos aceitar, não como inevitável no sentido catastrófico, mas como necessária ao crescimento, à evolução, à continuação da vida, à libertação, sem dúvida seremos livres do fardo do medo no convívio com ela e nos sobrarão energias para viver com dignidade e plenitude.
Esta a questão que devemos discutir aqui. E se cá estamos é porque não consideramos a morte como derrota, como fim, acreditamos na verdadeira vida e se assim cremos temos a obrigação de usar os talentos e a percepção que temos, para quebrar este vagalhão que cobre a humanidade e que a afoga, tirando a oportunidade de usar a energia da vida para a viver plenamente, exaurindo-a ao fugir da morte falsamente porque assim não se vive a vida.
Devemos sair daqui como multiplicadores da vida, do contrário teria sido melhor não vir. Sem nenhuma ameaça, lembro que nos cobraremos um dia (na morte, quem sabe), se nos mantivermos alheios, sem partilhar nosso conhecimento (lembremo-nos que a grande missão do homem é aprender, evoluir e sua segunda grande missão, partilhar com seu semelhante o conhecimento, a vida).
 A morte deve ser vista como uma Iniciação, uma passagem, o que realmente é, e assim podemos nos permitir justificar um certo medo, mais uma ansiedade do desconhecido, como ocorre em todo processo iniciático, desde a 1ª. caminhada, quando deixamos de gatinhar, o primeiro namoro, o primeiro isto ou aquilo. Tudo nos traz ansiedade, a do desconhecido e aliviamos, com isto, um peso, que passamos a trazer como um companheiro, não mais como um fardo. E claro que as outras primeiras vezes podem ser repetidas e veremos que se tornam dominadas por nós, enquanto a morte não se repete, não dá para ensaiar...
O domínio do materialismo, especialmente no Ocidente, se tornou tão carrasco, que ate as Religiões se afastaram da espiritualidade, um pouco por medo da fé crítica que busca explicação para os mistérios colocados como dogmas pura e simplesmente, mas muito pelo comodismo da inércia e por não aspirarem mais que manter o poder. Coisas do ser humano, não das Igrejas, diga-se a bem da verdade. É tão avassaladora tal pressão de imediatismo, consumismo, com promessas de nirvana imediato, atingido com o simples ter, a concretude dos bens materiais palpáveis, mensuráveis, ostentáveis, podendo ser consumidos sem riscos, sem esforços que, como dizíamos, as Religiões descarregam seus esforços em problemas sociais (que também são importantes, mas não a essência), coisas “da terra”, da matéria, visíveis, do aqui e agora. E todos, mesmo os ateus, nos ancoramos em alguma fé (como dizia o agnóstico: “Sou ateu, graças a Deus”...). E deveriam, elas em primeiro lugar, discutir, sem tergiversar, sem atravessar, sem fugir, os temas espirituais, a morte sendo o mais importante deles, na visão do homem formatado com a cultura a que nos referimos. É preciso praticar as virtudes teologais, pois assim não nos preocuparemos com o auto (repetimos, também severo) julgamento que faremos na iniciação da verdadeira vida. E todas religiões as adotam, as pregam, algumas ate as praticam. Mas... Não queremos condenar ninguém por tal postura, mas nos angustia a priorização, esta sim, inadequada. As coisas do espírito deveriam receber prioridade máxima. Também não queremos e não podemos super valorizar a espiritualidade, a meditação, a contemplação, na terra porque assim não cumpriríamos um dos nossos objetivos, a que chamamos “comerás com o suor do teu rosto”. E para vivermos exclusivamente de contemplação não haveria que consumir tanta energia, poderíamos ter ficado no colo do Pai curtindo as maravilhas... seria uma inércia total, uma inutilidade a toda prova e não suportaríamos tal situação, que nem Ele suportou, tendo nos criado para Sua alegria... Ah, o EQUILÍBRIO.
Outro grande medo que vivemos é o de “morrer à mingua” que se traduz, realmente, pelo medo de morrer sem assistência médica, “sem recurso”. Isto, hoje agigantado pela mídia que denuncia a todo momento erro médico, falta de condições do Sistema de Saúde Publico, serve para incutir mais medo e mais fuga do tema. Mas novamente o medo real é o do confronto com a consciência de nossos atos. E se o fizermos no “nosso campo”, exatamente como o time de futebol que julga jogar melhor na sua casa, com sua torcida, ou seja, em nossa casa, ao lado de nossos familiares, sabemos que poderemos, com o carinho e a energia dos que nos rodeiam, com o verdadeiro combustível da vida, o amor, ser menos inflexíveis no julgamento que faremos e o atravessar o umbral será, sem dúvida, menos sofrido. Então, não assumimos isto e dizemos temer a ausência do médico, quando mais importante seria a do pastor, a dos amigos, a dos amados. Claro que não nos referimos aqui à assistência necessária, sadia, a que temos direito e ate dever de nos submeter, como agradecimento pela vida na terra que recebemos, mas ao abuso que a medicina faz no trato com a morte (também por medo), ora não oferecendo qualquer assistência digna do nome, ora exagerando nos cuidados sob vários pretextos os maiores sendo esconder o próprio medo, e fugir dos processos que nos batem à porta. Um bom caminho para entender este medo é consultar o Leo Pessini, no seu livro “Distanásia”, onde a abordagem do tema é praticamente completa, absolutamente correta.
 Quanto ganharíamos se retornássemos no tempo, ao tempo de Alexandria, onde o ser humano era formado de maneira holística. Hoje nos inclinamos a conhecer cada vez menos do todo com a desculpa de que devemos aprofundar mais o conhecimento em cada área. Isto seria factível se nos comunicássemos, humildemente. Mas na verdade, o chavão de saber cada vez mais, de menos, apenas nos isola e isola o ser humano, que se vê, impotente, partido em pedaços cada vez menores.
Um dia, quem sabe, ele poderia ligar para o mastologista da mama esquerda, ou melhor, para o “areólogo”, e lhe avisar que estava mandando sua aréola esquerda para ele avaliar... Como se ele não tivesse de levar a mama inteira, e o corpo que a carrega, e a inteligência que gerencia o corpo, e o espírito que é parte não divisível do mesmo...  
Somos uma geração que se cansou de ser induzida a lutar para sobreviver. Mesmo que à custa do irmão que está ao nosso lado, mais ainda do que não vemos. É hora de pensarmos em VIVER, digna e plenamente, e de multiplicarmos as idéias que não nos pertencem, pois estão no âmago de todo ser humano, que conhece seu destino de glória, seu potencial. E, uma vez libertado dos medos nele incutidos, como o fizeram a nós, e sem culpar ninguém, muito menos nossos antepassados, poderemos todos mudar o titulo desta conversa para o que disse sabiamente o reverendo E. H. Hamilton:

“MEDO? De quê?
 De sentir a alegria do espírito liberto?
De passar da dor para a paz perfeita?
De ver cessarem as lutas e as tensões da vida?
Medo... de quê?

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